Escrevi o texto que segue há 7 anos. Ele falava sobre a minha vida de então, relembrando o passado. O nome do texto é "Há 10 anos". Quando tiver um tempo, vou escrever sua continuação.
E estou andando pela casa em que cresci.
E, no início, não quero nada, só pegar meu violão, e ir embora p/ minha casa.
Então acho alguns cadernos empoeirados. São cadernos do meu primário. De 1990 a 1993. E então lembranças começam a tomar meu pensamento, enquanto passo os olhos pelas folhas empoeiradas, preenchidas por letra infantil, com problemas matemáticos, ou recados.
Relembro dos amigos que nunca mais vi, do primeiro álbum de figurinhas completo, que perdi na mudança de casa, das comemorações, ou feiras de ciências com explicações agora simples, mas que eram complicadíssimas naquele momento.
Valores de mensalidades expressos em milhões de cruzeiros, depois milhares de cruzeiros reais.
Até chegar no recado sobre o luto pela morte do cantor Jessé, pai do aluno David, estudante da minha sala. Na verdade, David foi meu primeiro "melhor amigo". Mas após a morte de seu pai, mudou de escola, e nunca mais tive notícia. Suspeito que tenha sido a primeira grande decepção que tive, pelo menos, que lembro.
Então me vem o pensamento sobre o quanto seria bom reunir toda uma classe de mais de 10 anos atrás. Não consigo imaginar a gama de caminhos que cada um pôde escolher p/ seguir. Lembrei também do meu primeiro amor, que também foi meu primeiro fora. Um bilhetinho pedindo a menina (Thaís) em namoro, e a resposta que eu teria a resposta somente no dia seguinte. E a resposta foi "não". Graças a uma amiga da Thaís, que não gostava de mim. Acho graça de como as mulheres começam a fazer esse tipo de coligação tão cedo. Por onde será que anda a Thaís?
E me ocorre que estou com medo. Nunca notei como o tempo passa depressa. Sempre que se falava em "10 anos atrás", eu não tinha a dimensão correta desse tempo, pois não me lembrava da época. Quando tinha 18 anos, 10 anos antes eu teria 8, e não lembraria nada que acontecera naquela época. Agora não. Eu lembro das coisas que me aconteceram há 10 anos.
Tudo vêm à mente com muita facilidade, desde a reforma da casa, até a vinda do Rex, o cachorro que ainda está vivo, mas infelizmente, está velho, e não dura muito mais. Mais uma coisa que só agora vim perceber. Fazia uns 3 ou 4 anos que não via o Rex. Nunca me ocorreu que ele ficaria velho e morreria. Nas minhas lembranças não lembro de nenhum momento que pensei sobre isso, e brinquei "só mais 5 minutos" com ele. E agora não tenho tanto tempo assim, e ele não consegue mais brincar como antes. Não tem o mesmo fôlego p/ pular e correr. E é assim que estou me vendo, sentado na escada, olhando o Rex, e o prédio que agora esconde a bela vista que tinha das montanhas, e que tapa o sol que mantinha as árvores do meu quintal vivas, chorando feito uma criança que perdeu seu brinquedo. Mais um minuto próximo do fim. No caso, o brinquedo que perdi foi o tempo. Agora não dá mais p/ dormir com a janela do quarto aberta, p/ acordar cedinho, e sem o barulho da janela abrindo, poder observar as maritacas que comiam goiaba numa das goiabeiras do meu quintal. Ou correr com um pedaço de pão, que servia como isca p/ o meu cachorro! Agora o que restou foi uma sombra, uma árvore morta, e um velho cachorro, numa casa velha, que não parece mais a casa onde crianças corriam, e festas aconteciam.
E eu continuo lembrando dos amigos do bairro. Da Carolina, Camila e Cibele, as minhas primeiras amigas, que não vejo há mais de 10 anos. Nunca mais tive coragem de tocar aquela campainha. Nem sei se elas me reconheceriam. E continuo, e lembro das brincadeiras de esconde-esconde (que eram muito emocionantes, já que minha casa possuía vários esconderijos muito bons).
Agora me levanto, e sigo até o portão, e no caminho passo pelo corredor, que me dava medo. Agora passo por ele sem nem olhar p/ trás. Passo pelo jardim, que foi estrategicamente diminuído pelo meu pai, p/ caber mais um carro na garagem. E em algum lugar desse jardim está enterrado meu outro cachorro, que morreu há quase 10 anos, numa briga com o Rex. A natureza é feroz. Um dia, você é forte, e enfrenta qualquer coisa. O tempo passa, e o que você havia enfrentado está maior, e mais forte que você, e te vence. E olho p/ o muro que há 10 anos, eu tinha medo de subir, mas que mesmo assim, ia buscar o pipa que caiu no telhado. Entro no meu carro, e é meu subconsciente que se preocupa com a direção. O consciente está ocupado com lembranças. E pelo caminho para casa, passo pelo meu antigo colégio, que me traz mais lembranças, enquanto as lágrimas escorrem.
Dia 17 fez 4 anos que conheci uma menina que mudou o rumo da minha vida, mas não pôde continuar seguindo comigo. Ela seguiu o caminho dela, e agora eu sigo o meu. Incrível como parece ontem que eu a conheci, e tanta coisa mudou desde então.
E depois de alguns minutos, quando as lembranças se acalmam, eu consigo concluir que o que sou hoje, sou graças à esse passado que me entristece. Desde a teimosia, à facilidade de integração, que foram moldadas durante a adolescência, período que, ao que parece, está me trazendo mais confusões e dúvidas agora, do que em seu ápice.
E choro mais uma vez, escrevendo este texto, por ter lembrado de tudo novamente.
Cada livro que eu li, programa que eu assisti, brincadeira que joguei, agora me olham e cobram o resultado de terem passado pela minha vida. Tornei-me bom, ou mau? Ou simplesmente, tornei-me adulto - bem e mal juntos, compartilhando esta pessoa, que, como cada ser humano, é um universo indecifrável e sem tamanho?
E novamente me lembro que devo seguir e conquistar cada vez mais, mas não posso esquecer de viver esse tempo, pois daqui p/ diante, em qualquer tempo da minha vida, eu sempre vou lembrar do que aconteceu 10 anos atrás. E não posso correr o risco de chorar novamente daqui a 10 anos.
08 maio 2011
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