"Acho que e-mail tem suas limitações, principalmente se ao invés de buscarmos esclarecer, a idéia for sempre refutar, o que eu particularmente acho que é mais coisa para o Direito do que pra Filosofia."
R: Bom, A República é feito praticamente de refutações, comentários, réplicas, tréplicas...
"O comunismo (...) foi imposto como uma ideologia dominante! E por isto usou os métodos já descritos [uso da força] como os daqueles que querem impor uma ideologia. Não lembro de ter citado esquerda, direita ou centro. Facismo, comunismo, sempre que alguém assume que seu ponto de vista e o bom e que todos terão de aceitá-lo temos a tentativa de dominação."
R: O comunismo foi imposto como uma ideologia dominante, por isso eu o citei. O que estava sendo dito anteriormente era que as ideologias se impunham, e eu discordei disso justamente mostrando que não foi o comunismo que se impôs, e sim uma minoria com o uso da força o impôs. Só usei o comunismo como exemplo, mas não acho que sempre que alguém assuma seu ponto de vista como o melhor etc. exista a tentativa de dominação. A tentativa de dominação só vai existir se esse grupo minoritário tentar utilizar a força para subjugar o grupo majoritário. Ora, o grupo minoritário sempre pode não querer influenciar o grupo majoritário, e, resumindo, ir viver sua vida em paz em alguma floresta por aí (existem muitos grupos que fazem isso)...
"Não conheço nenhum exemplo no mundo que não seja dominado por uma ideologia específica(ou uma mistura de algumas já conhecidas), acontece que Ideologia está mais para Heráclito do que para Parmenides(rs,rs) Dá derrota de uma nasce outra, entra em mutação e vira algo supostamente novo, mais sempre tentando se impor ( o que geralmente quer dizer: a vontade de poucos sendo imposta à maioria)
O individualismo não é uma ideologia, mas pode ser fruto de uma. É só entender as premissas básicas do capitalismo."
R: Esse é um dos meus principais pontos desde sempre! Capitalismo não é uma ideologia! O capitalismo não é nada mais do que o resultado de um grupo de indivíduos que pensam em si e nos que o rodeiam em primeiro lugar. Ou seja, o capitalismo é resultado do individualismo de muitos indivíduos, com uma certa ética que rege as relações. E repare que isso que eu falo não se aplica somente a humanos; podemos ver esse comportamento na natureza, e justamente por isso que eu falei que o "sentido natural" é o individualismo. A ética é que é o "anti-natural", a inovação humana, o que nos diferencia dos animais.
"A sociedade decide? Como? Com que filtros??? Baseada em que? Clodovil foi um dos picaretas mais votados numa das últimas eleições. Quem decidiu (coletiva ou individualmente ) decidiu por estar consciente e com o senso crítico em dia? Ou devido a total alienação e desconexão com seu papel social (por isto sindrome do looping). Decidiu sim, mas mal, muito mal.
Devido a tal letargia e ao 'nada vai mudar mesmo'. Então podemos chamar isto de decisão? Acha mesmo que estas pessoas estão afim de perpetuar este absurdo, porque decidiram algo? O que é decidir?"
R: É complicado, mas sim, a sociedade decide. Quais filtros? Cada um tem o seu. Quando falei "a sociedade decide", eu deixei claro que quero dizer que individualmente cada um decide e o resultado é a decisão "da sociedade". A sociedade não existe como um ente indivisível que toma decisões. Cada um tem uma motivação diferente para votar ou não votar em alguém, e isso é, por direito, problema particular! Dizer que alguém decidiu mal por ter decidido votar no Clodovil é ser arrogante e achar que você vale mais do que essa pessoa! Ora, vá perguntar a um eleitor do Maluf se ele não estava consciente e com o senso crítico em dia e veja o que ele vai dizer...
Todo nós somos alienados em certo sentido, pois não sabemos tudo. Ora, a pessoa que vota no Maluf pq o Maluf deu um emprego ao seu pai em alguma grande obra vai achar que você é um alienado por não saber que o Maluf é um empreendedor. A pessoa que votou no Clodovil pq julgou que ele nunca teve papas na língua e portanto ia botar pra quebrar no Congresso teve e tem todo o direito de achar isso e pronto, e é um bom motivo pra ela! De novo: é arrogância dizer que essas duas pessoas do exemplo votaram errado, que são alienadas, que não tiveram filtros, que não tinham senso crítico. Aliás, esse negócio de "papel social" é coisa de quem quer acabar com o individualismo. Felizmente (para quem acredita no individualismo, como eu), a imensa maioria das pessoas não pensa em "papel social". Pensa, sim, no que é melhor para si. E, cada um pensando no melhor para si dentro de uma determinada ética (para isso servem as leis), traz o melhor para o grupo.
"Como é possível uma decisão sem consciência plena das implicações da mesma?"
R: TODA e QUALQUER decisão que tomamos é feita sem plena consciência das implicações da mesma. Há sempre um fator a mais. Você pode decidir virar à esquerda e ser assaltado. Você tinha plena consciência do que implicava sua decisão? Se tivesse, provavelmente não teria escolhido virar à esquerda, certo?
As decisões que tomamos são sempre particulares. Quem vota no Maluf pq acha que o Maluf gera emprego com suas obras faraônicas tem um ótimo motivo. Quem vota no Clodovil pq acha que ele vai botar fogo no Congresso tem um ótimo motivo!! Assim como quem acha que o comunismo é melhor que o capitalismo, ou quem acredita na síndrome do loop (leia-se: acredita que a técnica, os avanços científicos, etc, são descolados do ser humano, e a crítica é quem aproxima, o que, na minha opinião, é falso) tem seus motivos pra acreditar nisso e, se acreditam, é pq os consideram ótimos motivos!
Perceba, e acho isso engraçado até, que esse papo de "ah, o povo não sabe votar" só surge quando quem está falando discorda do que foi decidido pelo povo. Lendo o que você escreveu, me lembrei da última eleição pra prefeito. Enquanto a Marta esteve na frente, só se falava bem do povo. Que o povo sabia o que era bom, que tinha lembrança da administração da Marta, etc, etc. Mas foi só ela ficar em segundo no primeiro turno que já começaram a mudar o discurso. Quando ela perdeu, aí sim começou o show: "o povo não sabe votar", "o povo é burro", "o povo não pensa", "o povo não tem memória". As MESMAS pessoas que diziam aos quatro ventos que o povo era bom passaram a dizer o inverso! Na boa, isso é ingenuidade ou má-fé.
Ora, eu também discordo de muitos dos políticos que estão eleitos, mas acho que o povo sabe muito bem em quem votar. Até pq, qual seria a alternativa? Uma ditadura? Uma teocracia?
"E, não estou julgando o mérito da questão. Não se trata de dizer qual ideologia é boa ou ruim. Trata-se de identifica-las. Refletir sobre. Descostruí-las através do penamento crítico. Ver o que é possível fazer e então agir, capisci?"
R: Sim, em momento algum o assunto enveredou por aí. Só discordei desse ponto a respeito de "ver o que é possível fazer e agir". Isso não existe, assim, dessa forma. Reitero: a não ser que haja massacres, perseguições, milhões de cadáveres, não há NADA possível a fazer. Não há ação a ser tomada. Claro que, partindo da idéia de que não queremos uma guerra civil.
As mudanças ocorrem vagarosamente, de geração para geração. Não é preciso esse "empurrão". Veja o caso da eleição do Obama, por exemplo. Ele é um negro que foi eleito presidente de um país que teve leis raciais, ou seja, racismo institucional. Mas a eleição dele não foi uma quebra de um paradigma, uma revolução; foi bem o inverso! A eleição dele é o resultado de pequenas mudanças que aconteceram em 4, 5, 6 gerações. A eleição do Obama não mudou a sociedade. A sociedade é que mudou, e, como resultado, houve a eleição do Obama. Quebra de paradigma ou revolução seria se um negro fosse eleito na época da vigência do racismo institucional. Só que isso seria paradoxal, e a história nunca é paradoxal. Afinal, oras, ela aconteceu!
Meu ponto, portanto, é que podemos, sim, identificar ideologias, refletir, etc. Mas somente como observadores da realidade, não querendo alterá-la. Quem teve essa segunda intenção, e teve meios para pô-la em prática, só produziu cadáveres. Aos milhões.